"Segundo Sol" é tão ruim que "Avenida Brasil" parece acidente de percurso
João Emanuel Carneiro parecia o mais promissor entre todos os novos autores da Globo. Um sopro de esperança contra a mesmice, um ponto final nas fórmulas de outrora, um novelista anti-establishment.
Nunca fui muito fã de suas incensadas novelas das 7. Considero "Da Cor do Pecado" um dos epítomes da imbecilização que tomou conta da teledramaturgia nos anos posteriores, e "Cobras & Lagartos" uma triste página da história do nosso entretenimento.
Mas foram sucessos de audiência e mostraram que o escritor sabia rimar lé com cré, uma vantagem e tanto em um mercado competitivo como esse.
Veio a estreia no mais nobre horário de nossa televisão. "A Favorita" era divertidíssima, mas soturna como os melhores filmes do Supercine. Criou personagens inesquecíveis para os anais da era pós-bug do milênio, como Flora (Patrícia Pillar), Silveirinha (Ary Fontoura) e Dódi (Murilo Benício). Mas convenhamos: boa parte do apelo era o factoide criado em torno de quem seria a verdadeira vilã da história. Nada além de um castelo de cartas, um exercício narrativo.
"Avenida Brasil" foi arrebatadora. A mais bela sinfonia sobre a escalada de uma nova classe média no país que ainda encontrava-se em ebulição social. A histriônica Carminha (Adriana Esteves) era o destaque espetaculoso na jornada de sucesso do povo que ainda ousava acreditar "na rapaziada".
Era um mote de fácil absorção, a clássica história de vingança, com um filtro de extrema relevância factual. Não é à toa que se tornou um marco. Fora isso, atores como Murilo Benício, Eliane Giardini, Ísis Valverde e Marcos Caruso entregando os trabalhos de suas vidas. E o roteiro muito bem amarrado, dançando break em cima de obviedades e clichês da dramaturgia mundial. Tinha gancho em toda saída de bloco, um verdadeiro deleite.
Eis que João Emanuel Carneiro, embebido pelo sucesso da obra anterior, apostou na escuridão com "A Regra do Jogo". Apesar do inegável talento de figuras como Tonico Pereira, Giovanna Antonelli e Alexandre Nero, a novela foi um retumbante fracasso estético, conceitual e também de repercussão. Quis dar um passo além nos tons cinzentos dos protagonistas, esquecendo que o sucesso de "Avenida Brasil" era justamente a facilidade de sua trama central.
Infelizmente a curva decadente, pelo menos sob o ponto de vista do bom senso, continuou acentuada com a atual "Segundo Sol". Apesar do começo muito interessante, não manteve o fôlego por tempo suficiente. Hoje é um arremedo de novela, cujo núcleo central não engaja e com histórias paralelas que convergem rumo ao oblívio.
O roteiro varia entre o ofensivo e o terrivelmente desagradável. São tantos problemas ao longo da produção que é um milagre que a Globo ainda exista. Por muito menos, "Brida" foi encerrada com uma apresentação de PowerPoint na extinta TV Manchete.
Quando colocamos todo esse histórico na balança. fica parecendo que "Avenida Brasil" foi um ponto fora da curva. Talvez a grande falha dos trabalhos posteriores de João Emanuel Carneiro tenha sido a expectativa que criamos em torno de sua capacidade. Não me parece justo imaginar que esteja no mesmo patamar de Aguinaldo Silva, Glória Perez e até mesmo de Walcyr Carrasco no panteão dos autores da Globo.
Não sei se os resultados razoavelmente positivos de audiência serão o passaporte para manter a vaga do autor intacta no horário das 21 horas. Com o borbulhante investimento no GloboPlay, é possível que Carneiro encontre novo ânimo em séries para a plataforma de streaming ou até mesmo um eventual retorno ao time das 19 horas.
Voltamos a qualquer momento com novas informações.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.