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Comediante pode ser demitido da Netflix a dois dias da estreia de talk show

Chico Barney

12/09/2018 12h59

"Você sente falta da cocaína?", pergunta Norm para Drew Barrymore no trailer de "Norm Macdonald has a Show" (Foto: Divulgação/Netflix)

Norm Macdonald apareceu para o grande público durante os 5 anos em que esteve no elenco do "Saturday Night Live", entre 1993 e 1998, especialmente nas temporadas em que apresentou o "Weekend Update" –segmento em que comentava as notícias da semana com piadas curtas, incisivas e quase sempre ofensivas. Nos 20 anos seguintes, não fez nada que chegasse perto da relevância desse período, mas conseguiu manter o prestígio em alta entre comediantes da cena e também um pequeno séquito de fãs ardorosos.

De lá para cá, creio que sua grande realização do ponto de vista artístico tenha sido a notória excelência com que entrega comédia de alta qualidade quando convidado para talk shows. Suas participações nos programas de Conan O'Brian, em especial, são clássicos do gênero. Foi também o responsável pelo último e emocionante número de stand-up na despedida de David Letterman do "Late Show", no já distante ano de 2015.

Tentou emplacar como ator em seriados como "The Norm Show" e "A Minute with Stan Hooper", que tiveram vida curta, assim como no filme "Dirty Work", um clamoroso fracasso de público e crítica. Seu grande feito popular nessa seara foi a participação nos filmes da série "Dr. Doolittle", protagonizados por Eddie Murphy, onde dublou o cachorro do simpático médico.

Logo viu que essa não era exatamente sua praia. Além das bem-sucedidas turnês de stand-up, investiu em atrações mais parecidas com o saudoso "Weekend Update". Teve o também fracassado "Sports Show", que apresentou por apenas 9 semanas no Comedy Central em 2011, além do "Norm Macdonald Live", programa de entrevistas que circulou entre 2013 e 2017 no YouTube e no formato de podcast.

Coletâneas de sua fase no "Weekend Update" fazem sucesso no YouTube (Foto: Reprodução)

Compartilho com o amigo leitor toda essa capivara do comediante para que tenhamos noção de que não se trata de um artista extremamente popular. Norm passou a maior parte das últimas décadas à margem do mainstream. Isso fez com que alguns absurdos típicos do material que costuma apresentar desde os anos 90 passassem abaixo do radar de protestos mais relevantes por parte de seus alvos.

Enquanto escrevo essas linhas, "Norm Macdonald Has a Show" está previsto para estrear nesta sexta-feira, dia 14 de setembro. É a segunda produção dele para a Netflix, e o primeiro programa por uma grande distribuidora em muito, mas muito tempo. Como ocorre em lançamentos desse tipo, Macdonald está fazendo a chamada "turnê de imprensa", conversando com sites e revistas e comparecendo a programas para divulgar a novidade.

O Hollywood Reporter publicou ontem uma entrevista que pode colocar tudo a perder. Ao externar suas condolências a Roseanne O'Barr pelo tweet racista que tirou sua sitcom do ar, e também ao lamentar que Louis CK tenha "perdido tudo" de uma hora para outra graças às denúncias de mulheres que sofreram assédio do comediante, Norm se colocou no centro das atenções, mas da pior forma possível.

Estou feliz que o movimento #MeToo tenha dado uma acalmada. Costumávamos pensar "cem mulheres não podem estar mentindo". E aí isso virou "uma mulher não vai mentir". E depois virou "eu acredito em todas as mulheres".

Enquanto todo o showbiz ainda discute as consequências nefastas do machismo na própria indústria e a sociedade civil procura caminhos para combater o preconceito frente a tantos problemas escancarados em diversas denúncias, Mcdonald parece pretender mudar o enfoque para o perdão que supostamente devemos aos infratores.

Costumava funcionar assim: você admitia que estava errado, mostrava o quanto estava arrependido e depois recebia uma segunda chance. Agora, você admite que errou e logo está acabado. Então a única forma de sobreviver é negar, negar e negar. Isso não é saudável –não existe mais perdão. Acho que em algum momento, uma pessoa inocente vai colocar uma arma na cabeça e dar fim a isso. 

Concordo com todo mundo que disser que Norm Macdonald é um gênio. Particularmente, é meu comediante preferido de todos os tempos. Mas não me parece razoável defendê-lo depois de todas essas declarações. Ontem ele faria uma participação no "Tonight Show" de Jimmy Fallon, mas a emissora emitiu uma nota logo depois da publicação desastrosa da entrevista ao Hollywood Reporter.

Ainda não está claro se a Netflix continua com a estreia de "Norm Macdonald Has a Show" nesta sexta-feira. Os primeiros rumores garantiam que sim, mas o New York Times não conseguiu uma confirmação em matéria publicada hoje.

Será que o comediante conseguirá uma outra chance ou está acabado?

Veja o trailer do talk show de Norm:

Voltamos a qualquer momento com novas informações.

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Sobre o autor

Entusiasta e divulgador da cultura muito popular. Escreve sobre os intrigantes fenômenos da TV e da internet desde 2002